Quase 10 em cada 100 filipinos não têm emprego. A capital, Manila, com 11,5 milhões de habitantes possui bolsões de miséria espalhados às margens do Rio Pasig e em favelas disfarçadas por muros coloridos e becos. A opulência pode ser vista em poucos lugares, como nos arranha-céus de Makati. Contraste que atrai turistas de todo o mundo. A apenas 7,5km do centro financeiro da metrópole, o ex-inspetor de polícia Rolando Mendoza, 55 anos, tomou o ônibus da empresa Hong Thai Travel Services por volta das 9h30 de ontem (22h30 de domingo em Brasília), próximo à histórica cidade de Intramuros — onde construções ostentam marcas de tiros e bombardeios da Segunda Guerra Mundial. Nas mãos, carregava um rifle M16, calibre 5.56mm, capaz de disparar até 950 tiros por minuto, e pistolas.
Quando o veículo atingiu o Parque José Rizal, Rolando declarou que os 22 passageiros chineses e três filipinos haviam se tornado reféns. O ex-policial afixou na janela um bilhete com um aviso: “Um grande negócio vai começar após as 15h”. Mais tarde, colocou outro papel no qual dava poucos indícios sobre os motivos do crime. “Grande erro para corrigir uma grande decisão errada”, afirmava a mensagem. Onze horas e 15 minutos depois, o sequestro terminou de modo trágico, diante da Tribuna de Honra Quirino, onde os presidentes empossados costumam fazer seu juramento. Além de Rolando, oito reféns chineses morreram durante a tentativa da Swat de responder a disparos efetuados dentro do ônibus. O incidente lembrou a tomada do ônibus 174 (1), no Rio de Janeiro, em 12 de junho de 2000.
Foi uma tragédia anunciada, provocada por uma série de erros da polícia. Entre os primeiros tiros e a invasão da Swat, mais de uma hora se passou. Uma eternidade para uma crise que tinha tudo para acabar mal. Pouco antes de disparar contra os reféns, o sequestrador antecipou sua intenção, em entrevista por telefone a uma rádio. “Atirei em dois chineses. Vou acabar com todos se eles não pararem”, declarou. “Estou vendo policiais das forças especiais chegando. Sei que vão me matar. É melhor todos saírem porque, a qualquer momento, posso fazer a mesma coisa aqui”, acrescentou. Quando os agentes tentaram invadir o veículo, perceberam que dois reféns mortos estavam algemados à entrada. A polícia usou marretas para quebrar janelas e portas. Quando conseguiu acesso, foi recebida a bala. Depois, utilizou gás lacrimogêneo, sem ao menos saber se os reféns estavam vivos.
Morador de Manila, Pete Troilo — especialista em terrorismo da Pacific Strategies & Assessments (PSA) — confirma ao Correio que as táticas da Swat foram “questionáveis”. “Parece ter havido falta de determinação dos policiais”, avalia. “Esse tipo de incidente pode ocorrer em qualquer lugar, mas não é de bom agouro para um país que combate a imagem externa ruim e cujo governo tenta recuperar a reputação do turismo.” Uma sobrevivente, identificada como Leung, criticou a lentidão das autoridades em responder à crise. “Havia tanta gente no ônibus. Ninguém veio nos salvar. Por que? Ficamos com medo durante tantas horas. Foi realmente cruel”, desabafou a sobrevivente.
Demissão
Tudo o que Rolando queria era seu trabalho de volta. Em 1986, ele recebera o Prêmio Internacional Jaycees — que contempla os 10 policiais mais notáveis das Filipinas. A reputação acabou arrasada em 2008, quando Rolando e cinco colegas foram demitidos, sob as acusações de roubo e extorsão. “Ele ficou desapontado porque fez um bom serviço na polícia, mas foi dispensado por causa de um crime que não cometeu”, contou ao jornal The Philippine Star o também agente Gregorio Mendoza. O irmão de Rolando tentou negociar o fim do sequestro, mas terminou detido, suspeito de cumplicidade.
Para o filipino John Reuben Requiroso, morador de Cagayan de Oro City, a Swat cometeu falhas cruciais. “Os policiais jogaram gás lacrimogêneo dentro do ônibus, mas não tinham máscaras. Também não deviam ter arrastado Gregorio. Isso agitou Rolando”, afirmou à reportagem, após assistir à cobertura da tragédia pela TV. A presidenta das Filipinas, Benigno Aquino, defendeu a ação e explicou que seus policiais acreditavam na rendição. Mas a justificativa não convence Donald Tsang, líder do Conselho Executivo de Hong Kong. “A forma como a situação foi manejada, particularmente o resultado, é decepcionante”, disse.
Fonte:Correio Braziliense
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