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quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Explica, mas…

Opinião: DELFIM NETO

Por que os governantes permitiram que os Estados Unidos chegassem ao limite de endividamento, na iminência de suspender pagamentos?
Há várias respostas, mas, em síntese-, o que acontece é que, infelizmente, o presidente Obama não conseguiu recuperar a confiança da sociedade americana com as medidas que tomou para enfrentar o estrago que a crise financeira produziu na vida das pessoas e das empresas. Os democratas receberam o país das mãos dos republicanos já com as finanças públicas comprometidas e um elevado nível de desemprego, mas com um capital de esperança inspirado na principal mensagem de Obama na campanha eleitoral, o “eu posso, nós podemos”, que prometia uma revolução. No entanto, ele falhou.
Falhou desde o início, ao se assessorar mal politicamente e na escolha de uma equipe econômica muito ruim, que o levou a uma série de decisões equivocadas. Tenho sido cobrado pelo uso de uma expressão, digamos, demodée, chula. Mas não consigo me lembrar de outra mais adequada para explicar o grande equívoco de Obama e sua equipe: eles cuidaram de salvar os “patifes” que tinham produzido a crise e deixaram de lado os trabalhadores que tinham perdido o emprego por causa da crise.
O desdobramento foi a queda de confiança na capacidade de sua administração de enfrentar as consequências que o desastre financeiro estava produzindo nos níveis de emprego dos trabalhadores e na saúde das empresas. Incompetência que ainda mantém desempregados 15 milhões de trabalhadores americanos, que antes da crise ganhavam a vida honestamente.
A perda da confiança foi de tal ordem que hoje as empresas não financeiras nos Estados Unidos têm 2 trilhões de dólares em caixa e não investem, porque não enxergam num futuro próximo crescimento de demanda para seus produtos. O setor produtivo da economia não recebeu sinais amigáveis no início do governo e, na falta de estímulos críveis, segura o investimento porque não vê, por enquanto, melhora na confiança do consumidor, que teme o desemprego.
Apesar do enorme volume de recursos públicos injetado na economia, eles não funcionaram na direção correta de reanimar os setores produtivos: a economia não logrou emitir os sinais de recuperação que permitissem a retomada da confiança nas ações do governo. O gasto público continuou crescendo velozmente, a partir de uma base já bastante elevada deixada das administrações anteriores, com o nível do déficit atingindo a fronteira legal, digamos, para permitir ao governo honrar todos os seus compromissos. Obama deixou a porta aberta para os republicanos prepararem o troco aos democratas em 2012, nas eleições para a presidência, tornando a questão de pagar ou não pagar um problema político crucial.
O cabo de guerra entre republicanos e democratas que estamos assistindo no Congresso americano tem como objetivo definir quem chega mais bem fantasiado na festa eleitoral do ano que vem. Os republicanos estão se esforçando para passar o esmeril em Obama, exigindo, com precisão cirúrgica, cortes de despesas em cima daqueles programas de construção da sociedade de bem-estar que ele prometia rea-lizar na Presidência dos EUA. Obama precisará de alguma coisa mais que bons argumentos de defesa para explicar o fracasso de seus programas durante a campanha da reeleição que pretende disputar pelo partido democrata.
A situação não é nada confortável para os democratas, premidos pelo calendário e sabendo que não podem recusar o corte de alguns trilhões de dólares nos gastos públicos e a amputação de seus programas sociais. Resta a possibilidade única de direcionar a trajetória para outros programas e tentar o equilíbrio mediante aumento da arrecadação de tributos, coisa nada palatável mesmo se o contribuinte-alvo da nova alíquota do imposto estiver no patamar mais alto da renda (que nem por isso exclui os democratas).
Neste instante, há uma concentração do interesse político no calendário eleitoral, com os republicanos na dianteira dispostos a aplicar “lixa grossa” no Obama até a terça-feira 2 de agosto. Depois, é tratar de reunir os cacos.
Apesar de os EUA já terem, em outras ocasiões da sua história, atrasado contas e diferido pagamentos, ainda tenho dúvidas, neste momento (quarta-feira 27) se eles (mesmo com o radicalismo do Tea Party) cometeriam a loucura de promover um default que envolveria alguns dos próprios Estados americanos num verdadeiro furacão e provocaria traumas globais pré-datados…
Delfim Neto é economista, ex-deputado Federal e ex-ministro da Fazenda

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