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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Afinal, o que é o progresso?

Opinião
A publicação do Mapa da Violência 2011 – Os Jovens do Brasil revela dados assustadores. Dá muito que pensar. Não apenas em relação à questão da violência, mas impõe a todos – autoridades e cidadãos comuns – uma reflexão mais profunda sobre o tipo de progresso que nós desejamos para as futuras gerações.

O Mapa é um atestado de óbito em massa dos brasileiros com ênfase nos jovens, negros, pobres e nordestinos. Por sua vez, a causa mortis é uma associação nefasta entre o modelo de crescimento econômico e a ausência de políticas públicas que enfrentem efetivamente o silencioso genocídio.

Numa década (1998/2008), o Nordeste assistiu a uma escalada de mortes violentas: aumentos de 65, 80 e 37% em assassinatos, suicídios e acidentes de trânsito, respectivamente, sendo que na população jovem os números saltam para 94, 92 e 49% na mesma ordem.

O pesquisador, Julio Jocobo  Waiselfisz, que preparou o estudo, dá a seguinte explicação: “Há pólos que emergem com forte peso econômico e praticamente não têm a presença do Estado, especialmente nas questões de segurança pública”. Um adendo: nem em segurança, nem em saúde, nem em educação, nem em saneamento básico com padrões minimamente decentes.

Mais adiante, o Sr. Wauselfisz faz uma análise que reflete um cruel paradoxo: atribui como causa do fenômeno a “desconcentração” da violência sublinhando o avesso do que explicara, no passado, a migração interior/capitais/regiões metropolitanas, pois, agora, a inversão do fluxo decorre não da pobreza, mas da riqueza porque “as capitais e regiões metropolitanas começaram a receber mais investimentos e houve uma conseqüente migração da violência (sic)”.

Ou seja, até a publicação da pesquisa, a euforia por conta do crescimento da economia nordestina, acima do desempenho do Produto Interno Bruto nacional, escondia o horror do Inferno Bruto a que estavam condenados seus habitantes.

A questão não é mais promover a melhoria da qualidade de vida, mas assegurar a sobrevivência do cidadão.

Vem, daí, a pergunta que não quer calar: afinal, o que é o progresso?

Que progresso é esse que torna o cidadão refém do medo e prisioneiro da insuportável imobilidade urbana?

Que progresso é esse que perde a luta contra o mosquito da dengue e permite que pacientes agonizem e morram na fila dos hospitais?

Que progresso é esse que não consegue não formar cidadãos educados capazes de dar respostas aos desafios da sociedade do conhecimento e às exigências do pluralismo social e da democracia política?

Que progresso é esse que mede a pobreza pela renda e não pela “privação das capacidades básicas das pessoas” como preconiza Amartya Sen, referido no artigo publicado na edição do JC, 25 de fevereiro, de autoria do lúcido economista Sérgio Buarque?

Enfim, que progresso é esse que devora seus próprios filhos?

É o progresso cuja persistente lógica se baseia nas premissas falsas de que o crescimento econômico é um bem qualquer que seja o seu custo e que os recursos naturais têm a capacidade inesgotável de suportar a incontida cobiça humana.

É o progresso que transforma a necessidade de consumo na loucura coletiva do consumismo.

É o progresso que, na sua dimensão global, coloca em risco a sobrevivência da humanidade ao tornar escasso o que já fora abundante: a água, o solo, as florestas e, até mesmo, o ar que se respira. 

Com efeito, a catástrofe narrada pelo Mapa de Violência deixa uma lição simples para uma tarefa complexa e gigantesca: reinventar a noção de progresso, tarefa que não é de um governo, de uma nação; tarefa que tem a dimensão da própria Humanidade.

Para reinventar o progresso, não há respostas prontas nem soluções definitivas, porém o primeiro passo pode ser menos paixão pela economia e mais compaixão pelo ser humano.

 PS. Depois de concluído do artigo, a UNICEF divulgou (dia 26) relatório sobre a violência praticada contra jovens na faixa etária de 15 a 19 anos: 81 assassinatos entre 1998/2008 o que coloca o Brasil na trágica liderança mundial na matança de adolescentes.
Por Gustavo Krause

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