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sexta-feira, 4 de junho de 2010

Rolling Stones voltam ao topo das paradas




O novo álbum dos Rollings Stones colocou a banda britânica de volta ao topo das paradas de seu país, após um longo hiato de 16 anos. O novo álbum dos Stones não é um novo álbum, e sim a reedição de Exile on Main St., de 1972, acrescido de dez faixas inéditas, providencialmente redescobertas entre as gravações originais. A mais nova façanha de uma banda de rock fundada há 48 anos envia pelo menos dois recados ao mundo do pop de 2010, um deles referente ao presente e àqueles que vendem CDs, outro ao passado e a quem compra música.

No presente, é a ladainha já repetida vezes incontáveis. A falência da velha indústria fonográfica é tamanha que, volta e meia, lançamentos musicais são mais bem-sucedidos se tratados como peças de museu que como acontecimentos pertencentes ao espírito deste tempo. Coloca-se um punhado de “novidades” dentro de uma das obras favoritas de uma das bandas mais adoradas e, pronto, por alguns dias a gravadora pode até se esquecer de que Lady Gaga, hoje em dia, é uma só.

Na ponta do público consumidor, o chamariz é a parte “inédita” da remontagem, mas evidentemente o núcleo do fetiche está no passado dos Stones, de modo geral, e de Exile on Main St., em particular. “Coincidência” feliz, um documentário sobre as gravações originais surgiu ao mesmo tempo, foi exibido no festival de Cannes e seguiu para as TVs planeta afora (no Brasil, o canal Multishow exibe o filme no dia 4) – o DVD logo vem aí. E, toneladas de marketing à parte, Exile on Main St. é matéria real, concreta e consistente. Falou alto aos ouvidos de 38 anos atrás (sob reações críticas oscilantes, hesitantes e/ou resistentes, como é mais que habitual), ainda fala alto aos ouvidos de hoje.

Quando surgiu, Exile catalisou uma avalanche pesada de refluxos. Um a um, haviam sucumbido em poeira de guerra vários projetos libertários e/ou ensolarados da década anterior. Donos da metade do mundo que não era ocupada pela sombra dos Stones, os Beatles haviam encerrado atividades em 1970. O folk eletrificado de Bob Dylan estava em recesso. O flower power culminara nas mortes por overdose de uma série de roqueiros com nomes em J: Jimi, Janis, Jim, Jones (Brian, um dos Stones). O luminoso rock psicodélico derretia depois de se trincar em dois pedaços sombrios, rock progressivo para um lado, heavy metal para outro.No início dos anos 1970, os Stones amargavam a morte de Brian e divergências com a Receita Federal britânica. Por conta dessa última, segundo narra Robert Greenfield no livro Uma Temporada no Inferno com os Rolling Stones (lançado ano passado no Brasil), mudaram-se para uma mansão alugada na Riviera Francesa, em cujo porão seria gravado Exile on Main St. – “exílio” era o termo mais, digamos, romântico empregado pelos Stones para descrever a fuga do fisco. No ideário mais bélico do rock, costuma ser apreciada silenciosamente a mitologia de que a mansão teria pertencido a nazistas e sessões de tortura teriam sido aplicadas no mesmo porão onde mais tarde seria gestado o implosivo Exile.

Sexo, paranoia e drogas pesadas completavam os pilares da ambiência-clichê do rock’n’roll – Keith Richards vivia ali um de seus auges de dependência de heroína. Complexa e contraditória por si, a equação redundou num disco a um só tempo opressivo e oprimido, torturado e torturante, agredido e agressivo, assustado e assustador. Embora com o correr dos anos tenha adquirido status de obra-prima, era um álbum seco, sem clássicos pop dos Stones – aqui não há nada sequer parecido com "Satisfaction" (1965), "Under My Thumb" (1966), "Let’s Spend the Night Together" (1967), "Sympathy for the Devil" (1968), "You Can’t Always Get What You Want" (1969), "Sister Morphine" (1971) ou "It’s Only Rock’n’Roll (But I Like It)" (1974).

A empatia duradoura por Exile dirige-se um disco introvertido, raivoso e, sobretudo, sexualizado – “não mova sua cabeça/ não mova suas mãos/ não mova seus lábios/ apenas rebole seu quadril”, pede/ordena a letra de "Shake Your Hips", mais tensa que descontraída. Em 1972, iam longe o bom-mocismo dos Beatles (ao qual de fato os Stones jamais haviam aderido), as cores e flores hippies de Hair, a lisergia do rock californiano, a soul music aveludada dos anos 1960. Embora anestesiados por substâncias químicas em doses cavalares, os Stones perseguiam então os sons, as dores e as crueldades da dita “vida real”. É perturbador que, seja pelos vínculos com a crueza da realidade, pelo efeito dopante ou por uma mistura de ambos, Exile on Main St. permaneça tão vivo e soe tão atual aos ouvidos embebidos em urânio enriquecido, Lady Gaga e frotas de ajuda humanitária de 2010.
Fonte Ultimo Segundo

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